Estas foram algumas versões dos textos que eu recebi das queridas
pessoas que toparam escrever uma apresentação para o meu livro A LER VAZIOS,
mas que, por uma questão de diagramação, não foram publicados. Logo, penso que
seria uma falta de consideração se estes escritos simplesmente ficassem
arquivados no meu computador, depois delas terem depositado seu valioso tempo
para escrever tais palavras.
Portanto, estou publicando eles para que todas as pessoas tenham
conhecimento de algumas das leituras que podem ser feitas acerca da minha
pessoa e da minha arte poética.
TEXTO POR LÉSSIO LIMA CARDOSO
Última edição de 2014 do Sarau do Grajaú, comecei a ler uns poemas
concretos espalhados pelo ambiente. Perguntei ao cara que terminava de os
afixar se ele conhecia ou se o autor, Daniel Brito, estava por ali. "Sou
eu", respondeu. Aqueles textos foram um esquenta para o livro que viria em
breve.
Estávamos novamente na edição de fevereiro de 2015, ele lançando o
prometido “PrOtEsTIZANDO – Biênio Poético”. Todo o livro chamou a atenção pelo
conteúdo e beleza, mas o capítulo “Concretagem” sobressaiu-se. Eu mesmo imprimi
umas páginas e as utilizei, em uma aula, nas duas redes públicas a que
pertencia, a do Estado e a do Município de São Paulo. Foi tão boa a recepção
dos alunos que convidei o autor para uma palestra – a primeira dele – na escola
estadual.
Pouco depois, ele comentou que dedicaria o segundo livro à poesia
concreta. A partir daí, priorizou sua produção nesse gênero e aqui está “A ler
vazios”, que tenho a honra de prefaciar. Se, no primeiro livro, as composições
concretas ocuparam uma pequena parte, neste, é a poesia versificada que, de tão
pequena, mal daria um capítulo.
Daria, porque ele preferiu uma organização por temas: erotismo,
revolução e arte. Parece que esses três assuntos, já presentes na primeira
obra, lhe são os preferidos. Dizem que o erotismo é importante até depois da
morte e, como diz a música, “isso explica por que o sexo é assunto popular”.
Porém, entre os jovens, o tema é ainda mais central e antecede qualquer outro,
nas conversas informais. A subversão, também a explico pela idade, pois a
juventude – foi também o meu caso – é o auge do espanto diante do mundo que
“está aí”, sensibilidade que geralmente alimenta a intervenção e até o combate
social. Depois dos 40, comecei com essa mania de explicar quase tudo pela
“psicologia das idades”. Quanto à defesa da arte, sempre a vi como o artista,
independentemente da faixa etária que tem, vendendo o seu peixe, na tentativa
de angariar adeptos para a forma de expressão que usa.
Neste livro, Daniel Brito não economiza nos recursos. O leitor vai se
deparar, por exemplo, com pictograma (desenho figurativo de um objeto ou
conceito), caligrama (o texto forma uma imagem à qual se relaciona),
pinacograma (a imagem de uma pessoa representada com as letras do seu próprio
nome), palíndromo (pode ser lido da direita para a esquerda ou o
contrário), sudoku (um jogo de lógica), soneto e haicai (duas formas fixas
de poema). Haverá uso de elementos relacionados, por exemplo, a caça-palavra,
quebra-cabeça, história em quadrinhos, dobradura, colagem, games, baralho,
xadrez, dominó, esporte, tecnologia, língua inglesa, Geometria, Matemática,
Química e Filosofia. Ah, o autor usa também o recurso de omitir os caracteres
que quer que a gente leia, técnica que deu o título ao livro.
A consequência é que cada texto trará o modo de ser lido. Será
necessário um bom repertório para conseguir essa decodificação. Significa dizer
que descobrir o código que rege cada criação será o principal desafio do leitor
que, mantendo sua plena liberdade de interpretação, vai precisar de um
conhecimento mínimo do caminho percorrido pelo autor.
Para alcançar esse objetivo, uma dica geral seria o método baseado em
dois momentos, um de desconstrução e outro de reconstrução: o primeiro seria
decompor o texto-imagem partindo das partes maiores para as menores e o
segundo, relacionar novamente esses elementos, reconstituindo as articulações
até retornar ao todo. Complicado? Pois bem, se persistir a dificuldade, vale
tudo: algumas vezes, virei o livro; em outras, tive vontade de riscar ou dobrar
a página; em outras ainda, fiz anotações em folha separada; por fim, pesquisei
na internet.
Há textos de compreensão rápida, mas há aqueles em que o insight
demora ou nem vem. Eu mesmo, confesso que, a despeito de tantos recursos, não
dei conta de tudo e, mesmo assim, não me ressenti, pois a obra é volumosa e me
fartei com o que consegui apreender. O mérito fica, pois, exclusivamente para o
autor que domina toda essa multiplicidade de linguagens. Parece que a intenção
dele é interagir com o leitor principalmente através do desafio. Não é à toa
que ele costuma se referir ao seu público como “os entendedores”.
Indo além da simples representação, a poesia concreta presentifica
aquilo que significa. A expressão já é conteúdo. Forma e significado
mesclam-se. E Daniel Brito não é daqueles autores que ficam manjados pelo uso
recorrente de uma mesma técnica. Sua variedade de códigos faz com que a próxima
página reserve sempre uma surpresa: o que virá agora? Será que vou me divertir,
me emocionar ou refletir?
Quem escreve sabe
que dificilmente um bom texto nasce na primeira tentativa. Boa parte destes
aqui passou por um verdadeiro processo evolutivo, que demandou inspiração e
transpiração, em sucessivas retomadas para refeituras. Para um jovem de 23
anos, arrimo de família, universitário, com emprego fixo e grande parte do dia
dentro do transporte público, só sobraram as madrugadas e os finais de semana.
Detalhista, ele demora até a finalização e, mesmo após, mantém aquela
natural insatisfação do criador em relação à criatura, posto que esta será
sempre menor que aquele. Revelou-me que a mesma adrenalina do skate e da
bicicleta o faz produzir. Como todo artista, é um insatisfeito e usa a arte
para compensar os espasmos existenciais de falta e excesso: na falta, a arte
completa e, no excesso, deixa transbordar.
O fato é que Daniel Brito lança mão da arte e de outros meios para
manter o equilíbrio, atento ao risco de intempéries. Demonstra alegria. Um
sorriso fácil e largo para ninguém duvidar da felicidade. Um corpo meio
franzino, é verdade, para essa alma grandona; matéria pequena para tamanho
espírito. Fotogênico, porque as lentes se curvam à beleza, quando é completa. Tanta generosidade que, se pudesse, distribuiria gratuitamente tudo o
que produz. Sempre educado, gentil e ético, sob o risco de ser mal
interpretado. É dos amigos, é da família, é principalmente de si mesmo.
Entende, mas não se explica. Ao lado, mas não igual. Junto, mas não misturado.
É único e especial. Deus proteja e nos envie muitos daniéis britos!
* * *
D iferente
de tudo que se esperaria
A poética
em "A ler vazios" faz sentir o coração das máquinas
N ão só o
humano, convida ir além
I
mprescindível vislumbrar arte na matemática
E
xperimentações simples e complexas a decifrar
L iberdade
para os sentidos
B
rilhantes investigações artísticas de um jovem gênio das ruas
R efaz
cenas, revoluciona, afirma seu lugar no mundo
I mpetuoso
e concreto, Daniel Brito jorra poesia
T odo
diálogo se dará agora na dele em contato com a tua
O uça e
fale, sinta e revele. Há poesia em todos os mundos
Imagem da primeira prova impressa
Meu prefácio ficou grande demais. É que eu tinha muito a dizer sobre o livro e o autor. Estou satisfeito com o que escrevi (só devia ter tirado a vírgula de "Eu mesmo, confesso que..."). O leitor digital me perdoe o tamanho. O livro impresso trará uma versão enxuta desse mesmo texto, em duas páginas apenas. Uma aposta eu ganho: todos vão gostar da obra! Parabéns, Daniel!
ResponderExcluirLéssio L. Cardoso
Obrigado, Léssio!
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